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segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Identidade Transviada

Lembrou de quando fixava a janela com um olhar perdido, atordoado. Não sabia dar nome ao que lhe ocorria por dentro, sentiu vontade de chorar. Paulinho sempre lhe dizia: meninos não choram. Mas o peito apertava e ele era ainda tão jovem para entender certas coisas. Orfão de pai e mãe foi adotado ainda criança, os pais logo o mandaram para uma escola interna de padres. Foi lá onde conheceu Gabriel, olhos grandes, pele macia e um gosto apurado por leituras. Os dois estavam a algum tempo se olhando e naquele dia Pedro teve uma coragem que não soube explicar, beijou Gabriel e declarou seu amor. Sem jeito, o amigo saiu e foi para o refeitório, parado e pensativo a contemplar o céu de sua janela, Pedro tomou uma decisão que poderia mudar sua vida. Foi até o refeitório e beijou Gabriel na frente dos colegas e dos padres.
Na sala sentia calor e já não aguentava tanta espera, olhava o relógio e lembrava de Gabriel. Sim eles eram feitos um para o outro, quis a natureza que fossem iguais em corpo e alma, alma gêmea, palavra que Pedro sempre escrevia em seu caderno de anotações. Padre Amado lhe deu como punição, limpar os banheiros e rezar o dobro do que já tinha que rezar.
Na volta ao dormitório, encontrou Gabriel que não quis lhe dirigir o olhar, estava magoado, todos agora o chamavam de "maricas",
- Como você foi fazer aquilo, Pedro. Por quê?
-Eu não me importo com o que eles pensam, eu só sei que quero ficar com você.
- Eu te odeio, eu não sou "maricas", foi um momento de fraqueza.
- Você não precisa se enganar, sabe a verdade e tem medo dela.
Pedro saiu para cumprir sua punição, lavava os banheiros e ouvia a voz de Gabriel o repreendendo, doia saber que fora acusado pelo seu próprio objeto de amor. Não entendia porque tudo tinha de ser tão complicado.
Quando voltou ao dormitório, todos já dormiam, teve um impulso d eir até a cama de Gabriel, mas se conteve, deitou-se e olhou as estrelas, pareciam tão firmes e incoerentes naquele dia. Ouviu a voz que ouviria toda as noites em sua cabeça.
- Pedro.
Foi como se estivesse flutuando, via os olhos grandes e a pele brilhando de Gabriel, ele o chamava para uma possivel reconciliação. Foram até o banheiro, entreolharam-se e a energia de um para o outro era de entrega. Não haviam saberes, nem pressões naquele instante. Dois corpos iguais se tocavam e sentiam os pelos do corpo como que inteiramente eletrizados por uma sensação indescrítivel. Gabriel teve uma súbita reação, empurrou Pedro e cuspiu em sua face.
- Eu tenho nojo de você e de mim.
Pedro não sabia definir o que sentia, ele amava outro homem, poderia isso o definir como pessoa?
Como lidar com a frustação de Gabriel, Pedro o amava, mas sabia que estava fazendo mal à ele, talvez o tempo e a maturidade chegassem para Gabriel, ou talvez, não. Era um risco e Pedro sabia disso.
Com o tempo foram se afastando e só restou algo vazio e sem forma no peito de ambos, Pedro esquecera Gabriel, mas não quem ele era. Dói as vezes, mas ele entendia que não podia negar a si mesmo, anular sua existência seria como aniquilar-se.

Lembrou de toda essa história no altar, ao seu lado, uma mulher de véu e grinalda. O tal futuro o esperava, seria o Pedro pai, marido e homem bem criado pela ordem dos padres. Seguir o destino que algém lhe deu ou criar um novo roteiro para sua vida?
A palavra de ordem era: aniquilar-me.
O SIM, ecoou na catedral, a tarde estava caindo e um homem acabara de renúnciar toda uma existência em prol da opinião alheia.